domingo, 25 de março de 2012

Ser humano (?)

.............. O ser humano é muito estranho. Vive entrelaçado nas redes que ele próprio gera. Numa complexa teia, vive, morre e, quem sabe, volta a nascer! Num dia alegre, no outro triste... Num dia, perdidamente perdido, noutro, ainda, alegre. Num dia alegremente triste e noutro, ainda, consciente do caminho errante que percorre, embora o não deixe de percorrer. Num dia e noutro dia e noutro dia ainda!.... Os dias que quiser, como quiser!... Minutos, horas, dias... Sequência... Sempre a mesma sequência.................................................................



O ser humano é muito estranho.... Bicho racionalmente irracional, louco, complicado, imperfeito, incompleto,animal... ESTRANHO. Definitivamente estranho!

quinta-feira, 8 de abril de 2010

Fazer o que ainda não foi feito

Ao Pedro e a todos os Pedros da minha vida!...



Sei que me vês
Quando os teus olhos me ignoram
Quando por dentro eu sei que choram
Sabes de mim

Eu sou aquele que se esconde
Sabe de ti, sem saber onde
Vamos fazer o que ainda não foi feito
Trago-te em mim
Mesmo que chova no verão
Queres dizer sim, mas dizes não
Vamos fazer o que ainda não foi feito
E eu sou mais do que te invento
Tu és um mundo com mundos por dentro
E temos tanto pra contar
Vem nesta noite
Fomos tão longe a vida toda
Somos um beijo que demora
Porque amanhã é sempre tarde demais
E eu sei que dói
Sei como foi andares tão só por essa rua
As vozes que te chamam e tu na tua
Esse teu corpo é o teu porto, é o teu jeito
Vamos fazer o que ainda não foi feito
Sabes quem sou, para onde vou
A vida é curva, não uma linha
As portas que se fecham e eu na minha
A tua sombra é o lugar onde me deito
Vamos fazer o que ainda não foi feito
E eu sou mais do que te invento
Tu és um mundo com mundos por dentro
E temos tanto pra contar
Vem nesta noite
Fomos tão longe a vida toda
Somos um beijo que demora
Porque amanhã é sempre tarde demais
Tens uma estrada
Tenho uma mão cheia de nada
Somos um todo imperfeito
Tu és inteira e eu desfeito
Vamos fazer o que ainda não foi feito
E eu sou mais do que te invento
Tu és um mundo com mundos por dentro
E temos tanto pra contar
Vem nesta noite
Fomos tão longe a vida toda

Somos um beijo que demora
Porque amanhã é sempre tarde demais
Vem nesta noite
Fomos tão longe a vida toda
Somos um beijo que demora
Porque amanhã é sempre tarde demais
Porque amanhã é sempre tarde demais
Porque amanhã é sempre tarde demais
Porque amanhã é sempre tarde demais



[Letra de Pedro Abrunhosa]

segunda-feira, 29 de março de 2010

DA [DES]CONSTRUÇÃO DO HOMEM

"Há um tempo em que é preciso abandonar as roupas usadas - que já têm a forma do nosso corpo - e esquecer os nossos caminhos que nos levam sempre aos mesmos lugares...  É o tempo da travessia e, se não ousarmos fazê-la, teremos ficado para sempre à margem de nós mesmos" (Fernando Pessoa)




Pensar o ser é pensar a realidade que o rodeia, é reflectir o seu “mundo”, não enquanto espaço físico, mas psicológico e sentimental. Pensar o homem passa necessariamente por nos debruçarmos acerca de temas como o fatum, a brevidade da vida, a passagem do tempo, mergulhando, assim, naquilo que possui de mais particular. E o homem é, por excelência, um ser inexaurível. É interessante questionarmo-nos acerca de esse ser dotado de racionalidade quando muitas das suas atitudes revelam laivos de irracionalidade. Mais interessante ainda é termos a capacidade de lutar com “este eu sendo eu”, sempre com o intuito de compreender o homem que se revela antagonicamente como “the beauty and the beast”… Temas muito debatidos, é certo. Porém, não estão esgotados. Longe disso. São temas que acompanham o homem desde a sua existência e, por isso, permanentemente actuais.
Em relação ao destino, é fundamental a questão da liberdade, tão debatida ao longo dos tempos. O que parece mais comummente aceite é que o homem não é ingenuamente livre, nem é totalmente escravo. Desde a leitura dos poemas Homéricos que ficamos com a impressão de que o homem não é um ser totalmente livre. Lembremo-nos de Aquiles: desde o início ele sabe que morrerá. Aliás, toda a Ilíada o refere; ele próprio o admite: morrerá quando os deuses o quiserem. A verdade é que a liberdade está limitada a “poderes” que nos ultrapassam. É como se a liberdade fosse a resposta ao destino e talvez seja um privilégio ter destino.
O amor é também um dos topoi da literatura. Este sempre a acompanhou, originando diversas “filosofias de vida”, embora encarado de diferentes formas, consoante o tempo e época – umas mais racionais e outras mais emocionais.
Directamente relacionado com este sentimento surge, inevitavelmente, a problemática do prazer. É como se o homem estivesse forçosamente emaranhado nestes problemas. Uma das formas de os “resolver” é buscar uma felicidade relativa, sem desprazer ou dor, através de um estado de ataraxia e uma certa tranquilidade capaz de evitar a perturbação. Porque o homem é um ser, por natureza, intranquilo, mas também porque ninguém consegue viver continuamente na intranquilidade, o homem relativiza a dor e muitas são as soluções procuradas. Ovídio, por exemplo, escreve Remedia Amores ou não fosse este um tema tão soante na literatura.
Todavia, “nem só de amor vive o homem” e, voltando ainda à problemática da intranquilidade, constatamos que muitas são as suas inquietações: a efemeridade da vida, a passagem do tempo, a saudade, a morte, a dor da ausência, a liberdade, entre muitas outras. Haverá quem não questione isto?
Ao longo da história da humanidade, diversas foram os modos de retratar o homem e a sua condição enquanto humano. Desde a antiguidade, assistimos a um “desfile” de géneros que se demarcaram e continuam a demarcar-se precisamente pela sua temática. A tragédia, a comédia e a poesia não são mais do que exemplos disso e a acompanhá-los estão ilustres autores como Ésquilo, Sófocles, Aristófanes, Safo, Ovídio, Horácio, Dante, Camões, Pessoa, Sophia, entre muitos outros!
A verdade é que quer uns, quer outros fundam a sua filosofia prática na reflexão sobre o fluir do tempo, a futilidade dos bens terrenos, os enganos da Fortuna e a morte, pregam a moderação dos desejos e dos prazeres, as delícias do viver campestre, a vantagem em iludir o sofrimento com o vinho e o espectáculo da natureza. Sabem que não há felicidade completa, sabem que perante o infortúnio devemos compor um sorriso tranquilo e descuidado.
Mais do que valorizar a arte de um ou de outro, mais do que chegar a conclusões, é importante sobrelevar a intemporalidade das suas preocupações: a angústia do homem perante a brevidade da vida, a inevitabilidade da morte e consequentemente a interminável busca de estratégias de limitação de sofrimento que tão bem caracteriza a vida humana. Assim, não será a literatura também a (des)construção do homem? Não será preciso des(construir) para construir? Não será a aprendizagem um processo de desaprendizagem, um aprender a desaprender? Como refere Pessoa, esse “(…) É o tempo da travessia e, se não ousarmos fazê-la, teremos ficado para sempre à margem de nós mesmos".

Cassandra (Março de 2010)

segunda-feira, 22 de fevereiro de 2010

A que se reduz afinal a vida?

Salvador Dali, A Persistência da Memória

A que se reduz afinal a vida? A um momento de ternura e mais nada… De tudo o que se passou comigo só conservo a memória intacta de dois ou três rápidos minutos. Esses sim! Teimam, reluzem lá no fundo e inebriam-me, como um pouco de água fria embacia o copo. Só de pequeno retenho impressões tão nítidas como na primeira hora: hoje ouço como ontem os passos de meu pai quando chegava a casa; vejo sempre diante dos meus olhos a mancha azul ferrete das hidrângeas que enchiam o canteiro da parede. O resto vai-se com o fumo. Até as figuras dos mortos, por mais esforços que faça, cada vez se afastam mais de mim… Algumas sensações, ternura, cor, e pouco mais. Tinta. Pequenas coisas frívolas, o calor do ninho, e sempre dois traços na retina, o cabedelo de oiro, a outra-banda verde… Passou depois por mim o tropel da vida e da morte, assisti a muitos factos históricos, e essas impressões vão-se desvanecidas. Ao contrário, este facto trivial ainda hoje o recordo com a mesma vibração: a morte daquela laranjeira que, de velha e tonta, deu flor no inverno em que secou. O resto usa-se hora a hora e todos os dias se apaga. Todos os dias morre.

Lá está a velha casa abandonada e as árvores que minha mãe, por sua mão, dispôs: a bica deita a mesma água indiferente, o mesmo barco arcaico sobe o rio, guiado à espadela pelo mesmo homem do Douro, de pé sobre a gaiola do pinheiro. Só os mortos não voltam. Dava tudo no mundo para os tornar a ver, e não há lágrimas no mundo que os façam ressuscitar.

 
Raúl Brandão, Se Tivesse de Recomeçar a Vida

domingo, 14 de fevereiro de 2010

Penélope


Penélope,
há muito que não te vejo, nem sei de ti... Separam-nos as fronteiras do tempo. Anos passaram. Tróia! Sempre Tróia! Esta dura guerra parece não querer terminar e a verdade é que a minha impaciência tende a aumentar. Voltarei a ver a cor do teu olhar?.. E Ítaca? Voltarei a pisar a minha pátria? Olho o mar... Afaga-me a brisa ardente e consome-me a dor da distância.

[...]

É noite. Volto a contemplar o mar. Aquiles e os seus homens preparam-se para repousar. Devia fazer o mesmo, mas falta-me o sono. Faltas tu! A ideia de poder não regressar a casa aterroriza o meu espírito já tão pouco crente. Desanimado eu? Talvez.
As horas vão passando... Não tarda, o sol voltará a colorir o dia, afastando a escuridão da noite. Continuo sem sono. Não sou o único. Agamémnon também está de pé. Caminha de um lado para o outro na esperança da chegada de Hipnos.

[...]

Abraça-nos já a aurora de dedos róseos. É o anúncio de mais um dia. Tenho de ir. Aguarda-me a árdua tarefa de lutar contra os senhores de Tróia. Tróia!.. Sempre Tróia!..


Cassandra, Abril de 2009/ Quadro: "Penelope and her suitors", John William Waterhouse (1906)

domingo, 7 de fevereiro de 2010

QUO VADIS?


QUO VADIS?quo vadis? quo vadis? quo vadis? quo vadis? QUO VADIS?!...

terça-feira, 2 de fevereiro de 2010

Mais palavras para quê?... Simplesmente genial!

NÃO: Não quero nada.
Já disse que não quero nada.
Não me venham com conclusões!

A única conclusão é morrer.
Não me tragam estéticas!
Não me falem em moral!
Tirem-me daqui a metafísica!
Não me apregoem sistemas completos, não me enfileirem conquistas
Das ciências (das ciências, Deus meu, das ciências!) —
Das ciências, das artes, da civilização moderna!


Que mal fiz eu aos deuses todos?


Se têm a verdade, guardem-na!
Sou um técnico, mas tenho técnica só dentro da técnica.
Fora disso sou doido, com todo o direito a sê-lo.
Com todo o direito a sê-lo, ouviram?
Não me macem, por amor de Deus!


Queriam-me casado, fútil, quotidiano e tributável?
Queriam-me o contrário disto, o contrário de qualquer coisa?
Se eu fosse outra pessoa, fazia-lhes, a todos, a vontade.
Assim, como sou, tenham paciência!
Vão para o diabo sem mim,
Ou deixem-me ir sozinho para o diabo!
Para que havemos de ir juntos?
Não me peguem no braço!
Não gosto que me peguem no braço. Quero ser sozinho.
Já disse que sou sozinho!
Ah, que maçada quererem que eu seja da companhia!
Ó céu azul — o mesmo da minha infância —
Eterna verdade vazia e perfeita!
Ó macio Tejo ancestral e mudo,
Pequena verdade onde o céu se reflecte!
Ó mágoa revisitada, Lisboa de outrora de hoje!
Nada me dais, nada me tirais, nada sois que eu me sinta.


Deixem-me em paz! Não tardo, que eu nunca tardo...
E enquanto tarda o Abismo e o Silêncio quero estar sozinho!


Lisbon Revisited, Álvaro de Campos